terça-feira, 5 de setembro de 2017

Como o Clima fez História

A série documental How Climate Made History (SBS 2015) que passou recentemente na RTP3, dá-nos uma perspetiva recente da influência do clima na evolução da História. Desde a década de 1990 a pesquisa científica sobre mudanças climáticas evoluiu bastante, com o resultado da melhora da fidelidade dos modelos computacionais e do trabalho de observação. A pesquisa expandiu a nossa compreensão das relações causais com dados históricos e a capacidade de modelar as mudanças climáticas. Assim como as condições climáticas extremas contribuíram para a extinção dos Neandertais e permitiram ao Homo Sapiens moderno dominar a terra, também as condições climáticas favoráveis permitiram a ascensão de Impérios e promoveram o comércio e a prosperidade enquanto os eventos climáticos adversos geralmente levaram à guerra e a outras catástrofes humanas. Eis alguns exemplos que retive desta série.

O final da Idade do Gelo por volta de 17.000 AC, devido a alterações na órbitra terrestre que tornaram a luz do sol mais forte especialmente no verão, provocou ao longo de alguns milhares de anos o gradual aquecimento do planeta e que o clima ficasse mais ameno. As placas de gelo do Ártico e do Antártico começaram a derreter, a água dos oceanos também aqueceu provocando que a Corrente do Golfo começasse a fluir novamente, a evaporação para a atmosfera aumentou provocando chuvas regulares e aumentando a biodiversidade e criando as condições para as primeiras civilizações. Ao longo deste período o nível do mar subiu 120 metros, reclamando vastas áreas de terra fértil e inundando os deltas dos rios e ao longo das áreas costeiras e mudando assim o mapa mundial. A Bíblia relata estes eventos na narrativa da inundação no Genesis, e existem relatos em muitas sociedades humanas por todo o planeta desta Grande Inundação que ocorreu entre 10.000 e 5.000 AC. Mas houve um lugar que beneficiou destes eventos, a região do Sahara tornou-se verdejante nessa época!

Na altura do nascimento de Jesus Cristo, a radiação solar provavelmente decresceu e a Corrente do Golfo arrefeceu, tornando o clima terrestre muito mais frio. À medida que o clima frio e instável torna as condições de vida mais hostis, as tribos fora do Império Romano começaram a competir pelos recursos escassos, causando o início de uma migração em massa, movimentaram-se para sul e desalojaram outras tribos, provocando dezenas de milhares de refugiados do clima que iam avançando lentamente no Império Romano, avanço esse facilitado pela travessia dos rios gelados. À medida que mais tribos invadem, conquistam e se estabelecem no território romano, acaba por significar o fim do Império Romano do Ocidente em 476 DC.

A atividade solar aumentou consideravelmente por volta do ano 880, provocando o aquecimento da Terra e as estações do ano tornaram-se mais fiáveis. O Atlântico Norte tornou-se navegável a maior parte do ano permitindo o início das invasões dos Vikings por toda a Europa e que lhes permitiu também a exploração da Islândia e da Gronelândia e mais tarde da costa atlântica da América do Norte, 500 anos antes de Cristóvão Colombo. Com o aumento da temperatura as condições para a agricultura tornaram-se as melhores desde há séculos. A agricultura tornou-se intensiva, permitindo o aumento do comércio e o florescimento das cidades que permitiram o estabelecimento de uma nova ordem social constituída por cidadãos livres e comerciantes ricos e um desenvolvimento social na educação, artes e cultura que constituiu a base do mundo moderno.

A partir da segunda metade do séc. XIII ocorreram uma série de atividades vulcânicas em diferentes partes do mundo e em diferentes épocas, no vulcão Somali na Indonésia, Monte Etna na Sicília, vulcão Kuawe em Vanuatu, na fissura Laki na Islândia e finalizando com a erupção do Monte Tambora na Indonésia em 1815 (o ano de 1816 acabou por ser um ano sem verão em todo o planeta). Todas estas erupções lançaram cinzas e dióxido de enxofre na estratosfera, afetando o clima mundial por cerca de 500 anos, a designada Pequena Idade do Gelo, o mais longo período de clima frio desde o fim da Idade do Gelo, ocorrida mais de 10.000 anos antes. O avanço dos glaciares engole aldeias e leva à retirada dos Vikings da Gronelândia. As estações de cultivo tornaram-se bastante mais curtas trazendo a fome para a Europa Ocidental, o frio e a chuva excessivos ajudaram a propagar as pestes, e provocando um efeito profundo na sociedade humana. Teve também influência no clima político na Europa que deu origem à Guerra dos Trinta Anos e ao descontentamento da população que levou à Revolução Francesa que derrubou a Monarquia e abriu as portas à Democracia na Europa!

Finalmente o frio cessou por volta de 1850 e desde então as temperaturas moderadas moldaram o nosso clima. As drásticas mudanças tecnológicas e sociais com a Revolução Industrial trouxeram prosperidade mas também causaram uma alteração climática induzida pela Humanidade, de forma alarmante e sem precedentes. O nosso planeta tem aquecido gradualmente e está a lidar com o Aquecimento Global. Os desastres naturais são os sinais que indicam que estamos naquele ponto em que podemos decidir que tipo de clima pretendemos no futuro. Se as nações conseguirem reduzir as alterações climáticas será sensacional, já que será a primeira vez que em vez do Clima nos controlar a nós, a Humanidade conseguirá controlar o Clima e ter a certeza que teremos um clima estável para as gerações futuras.